A Memória Como Arte- Por Marcos de Castro

Artigo escrito em 1966

“Uma porção de jornais anunciou, quando da apresentação dos jogadores da seleção, dia 1º de abril, e insistiu depois, por ocasião do primeiro treino, em Lambari, que começara “a campanha do tri”.

Tôdas as agências de viagem- e não são poucas as que diariamente fazem publicidade de seus planos de excursão “em suaves prestações mensais”- procuram tentar o leitor na base de “vá à Londres e veja o tri”. Há um programa de televisão com nome de gôsto duvidoso – na base – na base da repetição insistente da mesma sílaba a ponto de quase enrolar a língua do pobre que se arrisca a dizer depressa a frase – que fala em tri.

Assim quase tudo, nesta época de preparativos para o Campeonato do Mundo, em Londres. Ou na Inglaterra, para dizer até com mais correção, porque o Brasil pelo menos deverá fazer a maior parte de sua campanha em Liverpool e talvez mesmo, dependendo de seus resultados iniciais, só jogue uma vez em Londres: a finalíssima, no caso de classificar-se. Então por que é que ninguém fala na “campanha para o Campeonato Mundial na Inglaterra”? Por que é que as agências de publicidade não falam em “Vá à Londres e veja a Copa do Mundo” e por que, enfim, os programas não tiram essa simpática palavrinha “tri” de seus nomes?    

Na verdade, jornais, agências de viagem ou emissoras de televisão podiam evitar essa coisa sem sentido de chamar a campanha do preparatória da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de campanha do tri, mas afinal de contas, trata-se de emprêsas particulares que podem agir como bem entender, desde que julguem que essa é uma maneira mais comercial ou mais eficiente, do ponto de vista de comunicação de massas, para atingir leitores ou fregueses. O que é mais grave é que a própria CBD, esquecida do quanto evoluiu de 1950 para cá, faça a sua publicidadezinha em caixas de fósforos ou por outros meios usando a mesma expressão tri.   A impressão que se tem é que o Brasil não vai disputar nada. Vai embarcar para Londres a fim de receber homenagens especiais, meter o “caneco” na bagagem e voltar com o tri tão sonhado. “Vamos à Londres para o tri”, “vá à Londres para o tri”. É. Não há quase ninguém  neste país – talvez mesmo os homens de govêrno, estejam dando o mau exemplo, não sei, mas o fato é que o tri é importante para êles e podem estar se adiantando aos fatos, num sonho bom – que hoje em dia deixe de se referir  assim ao Campeonato do Mundo. A lei do menor esfôrço, pelo menos essa, dá razão a todos êles: é tão mais simples – o tri. Para que essa complicação tôda de Campeonato do Mundo na Inglaterra?

Muito ao contrário da impressão que dá quando a gente ouve falar no tri, o Campeonato na Inglaterra, está longe de ser a festa da coroação daquilo que já conquistamos por antecipação êsse monossílabozinho tão maneiro. A Copa sempre foi uma guerra: eis a expressão mais sábia que se pode ouvir de quem já tem alguma experiência de mundiais de futebol. E, se sempre foi uma guerra, por que motivo haveria de ser diferente em Londres. É possível que haja  quem – anjinho- acredite que a tradicional fleugma e o velho cavalheirismos dos britânicos nos encha de beijos e os abraços, só. Mas só fora do campo. Que dentro do campo, no chamado calor da disputa, guerra é guerra. E nem só com os britânicos jogaremos nós, A impressão que se tem é, mesmo, que esta Copa mais do que nenhuma será uma guerra. Pelo menos desta vez há as características inéditas de alguém na disputa que pode ser tri e de três que podem levar a taça de vez. É fácil deduzir daí que a guerra será maior, pois nenhum dos outros deseja que a taça saia de disputa.” 

 

 

 

 

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